O que reunia esse grupo heterogêneo era o desejo de encontrar simultaneamente novas formas de criação e novas formas de organização coletiva. Essas duas inquietações se misturavam e os artistas envolvidos procuravam criar ao mesmo tempo novas relações da dança com o espaço cênico, com o corpo do intérprete em cena, e com o mundo a sua volta. Nesse sentido, a forma de partilha e o modo de organização do grupo eram tão importantes quanto o objeto da criação em si, como conta Sally Banes(…) O Judson Dance Theater se dedicou explicitamente a trabalhar de forma coletiva. E uma importante parte de seu trabalho foi descobrir conjuntamente, como chegar a decisões coletivas. A oficina semanal nunca foi um grupo exclusivo: um dos primeiros princípios foi o de que as sessões seriam abertas a qualquer pessoa que quisesse a elas assistir. Os participantes adotaram uma metodologia de consenso e, na primeira reunião, adotaram um sistema de cadeira rotativa (Banes, 1999:97)
Artisticamente o grupo era bastante diverso, cada um experimentando de formas diferentes o desejo comum de romper tanto com a tradição do balé clássico, quanto da dança moderna. Havia a sensação de que a série de movimentos e imagens produzidos nesses movimentos tinham se esgotado tanto eticamente quanto esteticamente como testemunha Yvonne Rainer em um artigo. Seria preciso uma outra intensidade, um outro modo de investir de energia o movimento. É fácil perceber porque um grand jeté deve ser abandonado. Não se pode “fazer” um grande jeté; deve-se dançá-lo para fazer com que seja feito, isto é, investir com todas as nuances necessárias de distribuição de energia que vai produzir a aparência do climax junto como uma suspenseo estática no meio do movimento (Rainer, 1974:66)
Seguindo esse desejo de alargar ao máximo o campo de possibilidades de experimentação em dança, o ateliê de Robert Dunn levou adiante a pesquisa a respeito da influência do aleatório e do acaso na composição coreográfica iniciada pela parceria entre John Cage e Merce Cunningham. Adotar o acaso como procedimento, como analisa José Gil, era uma forma de colocar em questão a intenção do sujeito na criação, o que tem por consequência problematizar também a noção de autoria (Gil, 2002:29). O aleatório desfaz as rígidas construções identitárias que determinam os lugares que devem ser ocupados e hierarquicamente definidos. Esse método permitia a criação de combinações improváveis, que davam vazão ao desejo de experimentação, que o coreógrafo Steve Paxton manifesta através da questão “por que não?” ao narrar a sua experiência no ateliê de Robert Dunn:
O meu trabalho foi despejar todos os meus “porque nãos” até ficar entediado com a questão.
’ (Paxton, apud Banes, 1993:10)
Esse por que não (que também era cantado no Brasil na mesma época pela voz de Caetano Veloso) é a manifestação de um profundo anseio de democratização da vida e da experiência estética, um questionamento de toda e qualquer forma de autoridade que punha em xeque o lugar da autoria, trazendo para dentro da experiência artística tudo aquilo que convencionalmente se mantinha de fora.
O método aleatório, o “por que não?” foram formas encontradas para promover esses encontros inesperados e fortuitos entre familiarem desconhecidos, desfazendo a lógica da identidade.
No Brasil esse desejo de experimentação vinha sendo levado a cabo por diversos artistas entre eles Klauss e Angel Vianna, mas esse é tema para o nosso próximo post…